Funeral de uma mãe

(William Blake, Cristo Redentor do Homem, 1808)
Fui hoje, ao meio-dia, à Missa de corpo presente da mãe de um confrade meu que vive em Bruxelas. Apesar da morte nos apanhar de surpresa, esta mãe tinha a idade de 99 anos. Viria mais dia menos dia. Nove filhos, quatro deles já morreram e, se um filho chora a morte dos pais, seja porque motivo for, o que não chorará uma mãe por um filho. E aqui o chorar não tem que ser a definição convencionada, como o acto de verter lágrimas. Não. Há lágrimas secas e lágrimas invisíveis, tão válidas como as que nos saem dos olhos. O choro tem associado uma dimensão afectiva. As lágrimas são emoção e afecção.

Foi uma celebração bonita. Os filhos leram poemas, o filho padre celebrou a Missa e foi-nos contando o que tinha sido a vida desta mãe. O poema do início da celebração, que não o fixei nem sei o autor, dizia lá para o final que "a um filho a mãe nunca morre".
Como se disse que ela gostava muito dos sonetos de Antero de Quental, fui ver se encontrava o poema mas em vão. Encontrei outro, com o título "Salmo", que esta senhora terá certamente lido e que me diz muito e que aqui fica como sinal de confiança e esperança em Deus:

Esperemos em Deus! Ele há tomado
Em suas mãos a massa, inerte e fria
Da matéria impotente e, n’um só dia,
Luz, movimento, acção, tudo lhe há dado.

Ele, ao mais pobre de alma, há tributado
Desvelo e amor: ele conduz à via
Segura quem lhe foge e se extravia,
Quem pela noite andava desgarrado.

E a mim, que aspiro a ele, a mim, que o amo,
Que anseio por mais vida e maior brilho,
Há-de negar-me o termo d’este anseio?

Buscou quem o não quis: e a mim, que o chamo,
Há-de fugir-me, como a ingrato filho?
Ó Deus, meu pai e abrigo! espero!… eu creio!

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