Missas em latim e rituais antigos - 2

O prometido é devido. E cá venho hoje escrever sobre a liturgia na tradição dominicana. A liturgia é um dos principais elementos da nossa vida. Normalmente classificamos em quatro estes elementos que nos definem: a vida comum, a celebração solene da liturgia, o estudo da verdade, as observâncias regulares e a pregação.
Nas nossas constituições vem logo no primeiro número sobre a liturgia que São Domingos quis que a celebração solene e comunitária da liturgia fosse uma das principais funções da nossa vocação (nº 57).
E é neste ambiente que os dominicanos celebram a liturgia: em comum e de uma forma solene. Quando se diz comum não se diz todos - não somos monges - e quando se diz solene também não quer dizer que seja sempre com incenso ou sempre missa cantada. O que torna a nossa liturgia solene é que ela seja glorificação a Deus e intercessão pelas necessidades da Igreja e do mundo. E isto fazêmo-lo em união com a Igreja.
Daí que não tenha sentido manter um rito próprio, por vários motivos. Um dominicano especialista em liturgia (González Fuente)aponta dois: (1) o rito dominicano não foi "criado" pelos dominicanos. Era a celebração de um rito comum da idade média, difundido em França, com algumas influências orientais; (2) uma vez que a intenção do Concílio era a de recuperar as celebrações litúrgicas dos primeiros cristãos não fazia sentido que os dominicanos mantivessem um rito medieval que, na sua prática, contradizia a teologia litúrgica em acções como preparar as oferendas durante a proclamação das leituras, a prostração dos frades na oração eucarística, todos os dias!...
Mas poder-se-ia argumentar: mas, então, perde-se a identidade?! E eu responderia: depende. Se identidade se reduz a ritos que contradizem o sentir comum da Igreja, ou a parecer diferente, então não vale a pena mantê-los. Mas nós mantemos a nossa identidade porque temos uma série de livros (Calendário, Missais, Liturgias das Horas, Rituais) próprios dos dominicanos, de onde celebramos quer os santos da nossa Ordem quer as nossas principais celebrações "internas" (tomadas de hábito, profissão, celebração das exéquias...). Isso, sim, identifica-nos: por um lado integra-nos na Igreja à qual pertencemos e, por outro, mostra e valoriza também a nossa tradição ad intra, uma vez que quem vem às nossas celebrações pode acompanhar esta nossa especificidade dominicana.
Termino com uma breve referência ao retorno dos ritos antigos, motivo pelo qual escrevi estes posts. Nem todos, no Concílio Vaticano II, aceitaram as decisões. O caso mais conhecido é o de Mons. Lefebvre, que ao não acatar as reformas do Concílio e, anos mais tarde, ordenar quatro bispos sem mandato papal, se afastou da Igreja, criando a Fraternidade Sacerdotal São Pio X. Não foi só ele nem os dele. Também entre nós, dominicanos, houve frades e monjas que não aceitaram as reformas do Concílio. E, separando-se da Ordem, dizem que são discípulos de São Tomás e de Santa Catarina de Sena.
Normalmente, as críticas que tecem à Igreja do pós-Concílio são sempre as mesmas: crise litúrgica (dizem que as missas do pós-Concílio são protestantes), a secularização, os desvios doutrinais (diálogo ecuménico, salvação...)...
Não tenho grande opinião sobre quem está certo. E a opinião que tenho vale o que vale. No entanto, acho que se estamos no 80 eles ficaram no 8. E creio que se deveria encontrar um meio-termo entre o padre-palhaço e o padre-inacessível. O pior dos argumentos é o de que a "missa à moda antiga" formou muitos santos. Nos tempos que correm também os temos.

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